sábado, julho 11, 2009

Empregos eólicos: afinal quantos?

Descobri uma notícia de Outubro de 2008, no Público, em que se dizia, a propósito da nova fábrica de torres de cimento da Enercon em Viana do Castelo:
"O gestor estima que quando a fileira eólica estiver concluída em Portugal dará emprego a 20 mil pessoas, de forma directa e indirecta, confirmando que a energia renovável é uma fonte de emprego superior à da indústria eléctrica tradicional e que a produção descentralizada de energia é mais trabalho-intensiva. Na Alemanha, por exemplo, a eólica representa 10 por cento da electricidade produzida, empregando cerca de 300 mil pessoas....Em Espanha trabalham 100 mil pessoas neste sector."
A notícia anunciava também a intenção de exportação a partir de Portugal pela Enercon de "torres, pás e geradores" a partir de 2010, um anúncio que ouvi ontem na SIC-Notícias reafirmar com grande convicção ao Presidente da AEP, a Associação Empresarial do "Norte".
Que a Enercon é a líder tecnológica mundial de turbinas eólicas presentemente, não tenho dúvidas. É a única fabricante que produz turbinas de velocidade variável com geradores síncronos, uma tecnologia pela qual tem uma guerra de patentes com os EUA como já referi, e por causa do que está proibida de exportar para lá precisamente até 2010.

Que a Enercon planeie exportar a partir de 2010 também não duvido, por ser então que se lhe abre o mercado americano, o de maior desenvolvimento no mundo presentemente.

Que Portugal tenha 45% do seu parque eólico com turbinas Enercon também acho positivo, só lamentando não se aproveitar a sua superior tecnologia para regulamentar regras técnicas de interligação à rede de qualidade, como fez a Irlanda onde a Enercon tem uma penetração semelhante.

Agora, o que me indigna são os números de empregos anunciados na referida notícia!
É que segundo a EWEA, a Associação Europeia da Energia Eólica que se assume como a "voz da indústria" europeia, num relatório publicado já este ano, afirma-se que, no final de 2007, a indústria eólica empregava em toda a Europa 108 mil e 600 pessoas e, incluindo os empregos indirectos, 154 mil; na Alemanha, empregos directos eram 38 mil, e incluindo os indirectos 48 mil (e não os 300 mil mencionados pela notícia do Público); em Espanha 20,5 mil e, com os indirectos, 38 mil (e não os 100 mil mencionados na tal notícia); e em Portugal, directos eram no fim de 2007 apenas 800, prevendo a EWEA a contratação de mais 3 mil a partir de 2009.
A EWEA calcula ainda que o número de empregos indirectos em Portugal associados à indústria eólica fosse de cerca de 500 no fim de 2007, reflectindo o excepcional peso dos custos de instalação e de ligação à rede que as eólicas têm em Portugal.
A EWEA nota também, no relatório mencionado, que a EDP tem um dos maiores portfolios de energias renováveis do Mundo, referindo-se à "EDP Renováveis". No entanto, uma rápida busca a relatórios desta empresa mostra que ela tinha em 2007 o modesto número de colaboradores de 240, que cresceu para 296 em 2008. Trata-se, evidentemente, de uma empresa financeira, e não de uma tecnológica!
325 mil empregos são quantos empregos a EWEA prevê que venham a existir em toda a Europa criados pela indústria eólica em... 2020! E certamente a EWEA não terá interesse em subestimar a sua capacidade empregadora...
Que fique claro que nada me move em princípio contra a energia eólica, uma indústria que explodiu esta década e que merece sem dúvida a classificação de "nova tecnologia"!
Do que gostaria é que Portugal tivesse tido uma estratégia para o sector que tivesse aumentado a sua ridícula incorporação de valor e emprego qualificado nesse tipo de energia, a de maior crescimento na Europa e quiçá noutras partes do mundo, presentemente!
E que não se mentisse tanto sobre o assunto!

2 comentários:

Anónimo disse...

Mais uma vez uma questão de "imagem"...

Não deixa de ser curioso como as indústrias nacionais estão a passar ao lado desta nova tecnologia (com excepção feita no caso dos transformadores). Como é que a EFACEC ainda não pensou em desenvolver tecnologia própria? Neste momento a incorporação nacional nas eólicas resume-se à montagem do equipamento que vem do estrangeiro.

Não é possível ter "clusters" de renováveis sem o desenvolvimento de produtos nesta área (ex.: pás, torres, geradores, semi-condutores de potência, inversores, sensores, etc.). Como as indústrias nacionais não se mostram muito interessadas temos de contar com a boa-vontade da ENERCON de abrir uma fábrica. Fábrica esta que pode ser deslocalizada quando as conveniências políticas mudarem ou quando o mercado português ficar saturado de geração eólica (tornando-se num mercado pouco atractivo).

O sector de serviços (em que se inclui o financeiro) é apenas uma parte de uma economia saudável. É necessário que a indústria também tenha expressão. O dinheiro não gera dinheiro "per si" (e se o faz o melhor é contar uma inflação enorme ou até hiper-inflação) mas serve para investir em indústrias (ou empresas) que essas sim produzem os bens que as pessoas necessitam ou desejam (fazendo ganhar dinheiro para todos). Esta tónica de concentração da economia no sector financeiro não é sustentável. É muito perigoso estar numa situação em que não há competência para fazer bens, apenas para trocar dinheiro por dinheiro.

Pinto de Sá disse...

Caro "Anónimo": a EFACEC só desenvolve tecnologias quando tem a certeza de ter mercado para elas. Mais: me regra só começa a desenvolvê-las quando já tem encomendas garantidas! Isto porque a EFACEC, sendo a nossa maior empresa de material eléctrico, no entanto não tem a força financeira (nem talvez o hábito...) que lhe permita planear tecnologias a longo prazo.
É aqui que o Estado e as suas empresas com "golden-share" podem ser instrumentais. Mas não o têm sido...
Acresce que quem tenha alguma vez desenvolvido uma tecnologia desde a ideia até á comercialização sabe que isso é coisa para nunca menos de meia dúzia de anos, o que exige mesmo planeamento a prazo.
O roubo da tecnologia da ENERCON pelo Echelon terá ocorrido em 1994, já os protótipos alemães estavam em testes e ainda Kioto não fora aprovado. Quer isto dizer que a Enercon deve ter levado uns 10 anos desde que começou o desenvolvimento dos seus produtos até os ter plenamente operacionais.
São coisas que a generalidade dos nossos decisores ignora, à falta de experiência nacional (e deles), e são planos com tempos muito superiores aos ciclos eleitorais.
É muito mais vistoso comprar feita uma central de ondas e dizer depois que se é "líder mundial", mesmo que a central feche imediatamente a seguir à inauguração...